O PAÍS ESTÁ VERDADEIRAMENTE A SAQUE

Por Rui Cortes, na XIII Convenção Nacional

Assistimos em todo o lado a múltiplos sinais que mostram o caráter cada vez mais destrutivo do processo de acumulação capitalista à escala global, onde a deterioração do meio ambiente e os reflexos das alterações climáticas se aceleraram a tal ponto que não é já possível discutir o futuro em termos de longo prazo dado que a civilização industrial e capitalista nos está a arrastar a curto prazo em direção ao abismo. Isto não é retórica.

Enquanto estamos confortavelmente sentados nesta Convenção, nuvens muito negras pairam sobre as nossas cabeças, que impõem ao Bloco de Esquerda reações rápidas e assertivas.

Vou citar apenas alguns exemplos mais recentes.

Começo com a proposta de desclassificação de áreas de Reserva Agrícola Nacional (RAN) e Reserva Ecológica Nacional (REN) para fins imobiliários, com a desculpa que é para resolver a crise da habitação; a construção do gasoduto ibérico (cozinhada entre os primeiros ministros de Portugal e Espanha) que irá afetar todo o interior norte, desde o Parque Natural da Serra da Estrela ao de Montesinho, implicando um tremendo impacto nas paisagens do Alto Douro Vinhateiro; o previsto aumento de 125.000 hectares de regadio por parte do Governo, destinado às regiões mais áridas do país, e consequentemente a pressão por parte dos latifundiários da CAP para a chamada autoestrada da água, ou seja, desviar água do Douro e Vouga para essa agricultura híper-intensiva do Alentejo; acrescente-se a extração do lítio, apadrinhada pelo inefável Galamba, a qual, nos 6 locais previstos, abrange nada menos do que 29 municípios, mas onde a pseudo transição energética envolve também mensalmente o corte de milhares de sobreiros para instalar centrais fotovoltaicas. Já nem falo dos projetos PIN de loteamentos turísticos na costa alentejana.

O país está verdadeiramente a saque, com ministros do Ambiente e Agricultura que são puros tecnocratas liberais, e por isso exige-se muito, mas muito mais do Bloco do que se deixar enredar pelas cenas de faca e alguidar das comissões parlamentares de inquérito, em que todos os órgãos de comunicação social seguem assustadoramente as pisadas da CMTV…

Chamo igualmente a atenção para a guerra da Ucrânia, por ser um desastre ecológico, consequência do aparelho militar-industrial da NATO e da Rússia. Para além dos milhares de mortos, o Programa do Ambiente das Nações Unidas (UNEP), aponta agora para um legado de extrema toxicidade no ar, na água e no solo que vai persistir durante muitas gerações em consequência dos incidentes nas centrais nucleares, infraestruturas energéticas, incluindo dispositivos de armazenagem e refinarias de petróleo, plataformas de perfuração e instalações de gás e gasodutos de distribuição, destruição de minas e instalações industriais e explosões e em fábricas de produção de fertilizantes.

As imagens de satélite mostram já a destruição dramática da maior parte de parques naturais e florestas. Mas onde anda o Bloco de Esquerda a exigir que cesse imediatamente o envio de material militar, que não passa de combustível para alimentar o conflito? Quero recordar que até ao início deste mês, Portugal enviou desde o início da guerra 800 mil toneladas em material militar. Quando é que isto vai acabar?

Em termos mais gerais, e porque estamos numa Convenção para definir estratégias políticas e não lavar de roupa suja, quero realçar que o Ecossocialismo deve ser a matriz do Bloco de Esquerda, mas tal implica uma crítica profunda, uma crítica radical das experiências e das conceções tecnocráticas, burocráticas e não ecológicas de construção do socialismo.

É necessário transformar o aparelho produtivo, mas também é imprescindível transformar o padrão de consumo, que é o padrão do capitalismo baseado na produção massiva de objetos artificiais, inúteis, e muitas vezes poluentes.

Nesse sentido, a ação do Bloco de Esquerda deve assentar numa estratégia de luta que que deve criar a convergência das lutas sociais com as lutas ecológicas. Afinal, o contrário do que se ensina nas Escolas de Negócios, as business schools, os MBA, onde o capitalismo é apresentado como uma ciência e não como uma ideologia, sendo precisamente esta combinação de ideologia e tecnocracia que transforma as escolas de negócios em locais onde se propala encapotadamente o neoliberalismo para as novas gerações universitárias

Fala-se em levar o pais a sério, mas o Bloco só é levado a sério se for anticapitalista, nas ruas e no Parlamento, e com democracia interna.

Rui Cortes

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