por Carlos Matias
Anualmente, o Fórum Socialismo organizado pelo Bloco de Esquerda marca o reinício da intervenção pós-férias estivais. Este ano, a iniciativa terá lugar entre 30 de agosto e 1 de setembro, em Braga. Como habitualmente, além de alguns rostos mais conhecidos do Bloco, participarão convidados de variados domínios.
É natural e desejável a abordagem de variadas áreas da política, acolhendo diferentes visões. No seu conjunto, seria de esperar que, de uma ou de outra forma, contribuíssem para o aprofundamento e fortalecimento da intervenção partidária. Afinal, trata-se de uma iniciativa do Bloco de Esquerda que visaria afirmar a luta anticapitalista e anti-imperialista, pela paz.
Não parece, contudo, ser esse o desiderato principal dos organizadores.
Na linha das sucessivas cedências a posições belicistas, em relação à NATO e a propostas vagas e equívocas, quando se trata de demarcação política com o PS, este ano a direção do Bloco resolveu ir mais longe. Para o Fórum Socialismo 2024, convidou Teresa Violante, ex-vereadora do PSD, e Augusto Santos Silva (ASS), da ala direita do PS.
Um membro do Secretariado explicou que a inesperada amplitude nos convites se deveria à necessidade de acolher “contributos de todos os espetros políticos para fazer frente a forças anti-democráticas.”
O convite do BE a ASS é especialmente peculiar. Em fevereiro de 2009, o destacado dirigente do PS afirmou que o Bloco de Esquerda era “das forças mais conservadoras e reacionárias” que conhecia e que o Bloco gostava “de se dizer de esquerda ou plebeia ou chique”. Para ASS, o BE seria uma força de direita, na qual gostava de “malhar”.
Não se espere, contudo, que ASS participe no Fórum Socialismo 2024 para “malhar” em quem o convida. A explicação pela aceitação do convite virá de evolução entretanto ocorrida. Ou mudou o pensamento do inesperado palestrante, o que não parece provável; ou se alteraram as suas expectativas, face à evolução do Bloco, em progressivo alinhamento com a grande frente da guerra e do armamentismo.
De resto, um ano volvido sobre as contundentes acusações ao Bloco, em junho de 2010, quando publicou o ensaio “Os Valores da Esquerda Democrática”, ASS já abandonara a vontade de malhar nesta esquerda.
Continuava, é certo, a considerar que todas as diferentes variantes das revoluções comunistas “foram e são projetos contra a dinâmica histórica” e “denegações da liberdade e do progresso”. Mas, ao mesmo tempo, já “considerava como seus interlocutores prioritários à esquerda, as correntes radicais que já concluíram ou estão a terminar um percurso de integração plena no sistema institucional demoliberal e de aceitação sem reserva dos valores e princípios organizadores da cultura democrática ocidental”.
O Bloco estaria a mudar. Visão premonitória – reconheçamos. Anunciava-se o tempo do diálogo.
Ele aí está, com direito aos holofotes da comunicação social . A prioridade de ASS encontra a correspondente abertura na atual direção do BE. É certo que o abraço entre a “esquerda democrática” de ASS e a direção do BE, implicou, como contraponto, a exclusão do programa do Fórum de diversos rostos de esquerda (alguns do próprio Bloco), inicialmente propostos. Facto considerado irrelevante pelos novos convertidos à “cultura democrática ocidental”…
A necessária mobilização de novos sectores para a luta contra a extrema-direita não pode apagar a responsabilidade que PS e PSD (sobretudo estes) têm pelas medidas anti populares que adubam o terreno onde crescem “Chegas & Cª”. Há pouco mais de um ano, ainda a direção do Bloco explicava que “O PS é o verdadeiro responsável pelo avanço da extrema-direita e a má política é o que abre espaço a esse ressentimento do qual se alimenta a extrema-direita” (Observador – 28.05.2023).
Agora, incoerentemente, um dos principais responsáveis pela dita “má-política” do PS é convidado para falar do combate à extrema-direita, no Fórum do Bloco de Esquerda. A denúncia e o combate ao neoliberalismo deixaram de estar no centro do combate consequente à extrema-direita, polidamente classificada como “anti-democrática”.
Em resumo. Para a direção do BE o combate à extrema-direita exige que não se turve a entente cordiale com o PS, linha estratégica que vem sendo adotada pela maioria da direção do Bloco, com resultados eleitorais desastrosos.
Para a maioria da direção do BE, amplitude à direita? Claro! À Esquerda? Nem por isso.


