O movimento popular gerado na sequência do 25 de Abril marca profundamente o quadro político português nos anos de 1974/75, durante o chamado PREC (Período Revolucionário em Curso). Os fundamentos da democracia, das liberdades e dos direitos, a extinção da polícia política e da censura ou a exigência do fim da guerra colonial – tudo foi conquistado na rua, nas fábricas, nos bairros populares, nas escolas e nas zonas rurais. Nada foi oferecido.
O golpe militar do 25 de novembro acontece já depois da realização de eleições para a Assembleia Constituinte, em abril/75, condição primeira para a realização de eleições legislativas a breve prazo. Estabeleceu-se um compromisso entre a legitimidade revolucionária e a parlamentar. “Ao contrário do que afirma a direita política e historiográfica, a democracia política não existe em Portugal apesar da revolução, mas porque houve a revolução.”[1]
Os vencedores do golpe quiseram alterar as regras do jogo, retirar da equação democrática a legitimidade da iniciativa popular e revolucionária. Quiseram impor o seu próprio dicktat hierárquico nas Forças Armadas para anular a aliança essencial com o movimento popular no processo revolucionário. Os chefes do golpe ordenam a prisão de 118 militares, saneiam da RTP e da Emissora Nacional 82 trabalhadores e demitem as administrações e direções da imprensa pública, substituídas por gente do PS e do PPD ou militares ligados ao golpe. Começa a reversão de conquistas populares e a destruição de muitas experiências de gestão popular.
O que esteve em causa foi a revolução democrática do PREC. O 25 de novembro foi preparado e dirigido pelo PS com o PPD e o CDS, aliados aos bombistas e sob o patrocínio da CIA e do ativo embaixador dos EUA em Portugal, Frank Carlucci, com o apoio dos governos alemão e francês.
É uma ideia peregrina alguém dizer que se tratou apenas de um golpe “intramilitar da direita”[2], sem “consequências imediatas na estrutura do poder político”, com o argumento de que a Constituição acabou por ser mais tarde aprovada como garante da democracia.
Talvez sirva, apenas, para justificar a participação do Bloco na comemoração do 25 de novembro no Parlamento, ajudando a minimizar o carácter reacionário do golpe como pretende o centro político. Não haverá discurso que consiga esconder o significado público da participação naquele ato que toda a direita e extrema-direita quer que seja equiparável ao do 25 de Abril.
A insistente procura da neutralização da centralidade histórica do PREC para a democracia faz parte dessa “gigantesca ofensiva ideológica por parte das direitas neoliberais e fascizantes, dessa guerra cultural contra a democracia, o socialismo e todas as expressões do pensamento emancipatório que está em curso”. [3]
O Bloco, em vez de marcar o campo que se opõe e resiste a essa ofensiva, adapta-se, em nome da proximidade e de ansiadas alianças com o centro, ao aceitar a comemoração do 25 de novembro juntando-se a ela, mesmo que de forma envergonhada.
Moção E na Mesa Nacional do BE
Novembro 2024
[1] Fernando Rosas, “Ser e não ser – Notas sobre a Revolução portuguesa de 74/75 no seu 40º aniversário”, revista Vírus n.º 5.
[2] Luís Fazenda, “O 25 de novembro: para lá dos tiros”, esquerda.net 20.11.2024
[3] Fernando Rosas, “A crise do capitalismo tardio e a banalidade do mal”, esquerda.net 19.11.2024

