de Liberato Fernandes
por Mário Tomé
Muito oportuno e necessário este livro de Liberato Fernandes.
Trata-se de um instrumento sério, de preparação para a luta contra a guerra, ou seja, contra o capital e a sua forma política expansionista, o imperialismo.
Quando Rosa Luxemburgo nos colocou perante o dilema “socialismo ou barbárie” ela não imaginava que chegássemos tão rapidamente à barbárie.
De facto, é onde nos encontramos mesmo depois de termos vencido e suposto que ultrapassado o nazismo e o holocausto.
A Revolução Francesa que abriu as portas ao desenvolvimento exponencial das forças produtivas pela burguesia prometia-nos também, com a declaração des Droits de l’homme et du citoyen, as bases para uma evolução da humanidade orientada pelo que o ser humano possui de radical e de mútuo entendimento na sua relação enquanto ser eminentemente social e com a natureza.
Entretanto surgiu um malandro entre o filósofo e o cientista, capaz também das maiores tropelias e malandrices, trabalhador incansável, estudioso sem limites, embrulhado em utopia e proposta de revolução, com base na ciência e na história da antiguidade toda, dos etruscos aos gregos aos hebreus aos romanos aos primitivos cristãos até aos artistas e filósofos do universo todo, de todos ele bebeu e aprendeu, Karl Marx de seu nome e apelido, que nos alertou para que «o capitalismo veio ao mundo espirrando sangue por todos os poros» e, como a história nos mostra, assim continua cada vez com mais violência, bestialidade e… cinismo hipócrita.
Isto quer dizer que naqueles curtos espaços de tempo em que, embalados pela suave condescendência ou ignorância ou ainda distração contemplativo, nos alheámos pouco que fosse, da bestialidade inerente à brutal exploração e violência contra o, por enquanto, elo mais fraco, ou seja o proletariado cada vez mais explorado mesmo que com a grande criatividade tecnológica, arámos o terreno para engordar o ogre que hoje já nos vai devorando.
Na actual situação mundial em que a mais eficaz arma do imperialismo – qual bomba atómica qual quê !!!- é a liquidação do pensamento crítico suportada pela imposição, garantida pelas conquistas da civilização e avanço tecnológico, da ignorância massiva através da ideologia do realismo capitalista, ou seja é assim porque é assim e sempre foi e assim será, este livro de Liberato Fernandes, cujo título mostra bem ao que vem, é de grande utilidade para ajudar a romper a teia de aranha em que nos deixámos enredar e encontrar o Fio de Ariadne para nos libertarmos e agirmos em conformidade.
A História, a ciência das ciências, sofre tratos de polé para justificar todos os crimes hediondos praticados pelo imperialismo e “seus lacaios”– como dizíamos dantes, e que bem sabia!
A atitude das democracias – dava vontade de dizer, chamadas democracias, mas não: – são mesmo estas as reais democracias da época do capitalismo apodrecido e do imperialismo genocida – perante o anúncio do apocalipse, é de empenhadas participantes ao ponto de instituírem, salvo algumas excepções, a perseguição e mesmo criminalização do apoio explícito à luta do povo palestiniano massacrado, violentado, expurgado sem apelo dos seus direitos, aprisionado na sua própria terra, transformada num imenso campo de concentração para massacre e abate.
E, até certo ponto, entende-se porquê: a nossa civilização está erigida por cima de um monstruoso, global e quase rotineiro genocídio dos povos com que contactou e que dominou.
Desde a chegada dos portugueses e dos espanhóis às Indias Ocidentais, foram exterminados milhões de Índios, habitantes daquelas paragens. A guerra do ópio promovida pelo império britânico impôs aos chineses o consumo mortífero de ópio como forma de equilibrar a balança comercial.
O Rei Leopoldo II da Bélgica na sua propriedade particular em que ele transformou o domínio do Congo. foi responsável pelo extermínio de 30 milhões de negros perante a passividade das outras nações civilizadas.
O imperialismo norte-americano, que substituiu o decadente império britânico depois da primeira guerra mundial, nasceu com o genocídio praticamente total dos Índios originários, a que se seguiu a escravatura que deu lugar a um sistema segregacionista e de verdadeiro apartheid que só abrandou a seguir à II Guerra Mundial e de que ainda há sequelas gritantes e aviltantes.
Destas raízes podres se fez a democracia norte-americana, o argumento da defesa do liberalismo que foi e é a ponta de lança para a intervenção criminosa e terrorista dos EUA, para imporem uma hegemonia global sustentada pela hegemonia do dólar e concretizada também no domínio de todas as organizações internacionais desde a ONU, a OMC, o FMI, OCDE e o que mais práí houver e, ainda, mais refinadamente a NATO e nas mais de oitocentas bases militares impostas em todo o mundo.
Depois da queda da URSS a estratégia dos EUA dirigida pelos neocons sofreu uma viragem e os famigerados Bush, pai e filho, foram os instrumentos que serviram a estratégia do “bando dos três”: Wolfowitz, Rumsfeld e Cheney. O momento crucial, por eles mais preparado do que aguardado, foi a destruição das twinn towers, o «Novo Pearl Harbour» de que meses antes eles tinham anunciado que os EUA necessitavam para sair da cepa torta.
Foi, pois, o momento alto do início da viragem na estratégia de domínio: da democracia liberal e da luta contra o comunismo, em que implantaram as mais bárbaras ditaduras, em especial na América Latina, passou-se à “guerra ao terrorismo”, afirmando-se afinal com o mais brutal terrorismo de Estado e de promoção de guerras contra os povos e entre os povos, sem abandonar, no entanto, a técnica de mudança de regimes.
Se virmos bem os Estados Unidos foram a única potência realmente imperialista desde o fim da primeira guerra mundial reforçados pela vitória na segunda que, aliás, foi possível graças, essencialmente, à estratégia soviética desde que ficou claro, com a publicação do Mein Kampf, qual o objectivo final de Hitler: a expansão para leste!
Hitler dizia no Mein Kampf: «Quando falamos hoje em novas terras no continente europeu, pensamos antes de mais na Rússia e países vizinhos dela dependentes.». E já antes, em 1937, declarava numa conferência: «Para nós não se trata de conquistar povos mas apenas conquistar terras para utilização agrícola». E Himmler acrescentava que não estavam interessados em germanizar os povos, mas sim «que no leste possa viver um povo de origem puramente alemã».
Ou seja, não apenas o holocausto mas ainda o genocídio dos povos da URSS.
Qualquer semelhança com o que preconiza o sionismo genocida de Israel, não é pura coincidência: Golda Mair, primeira-ministra de entre 1969 e 1974 que esteve quase também a ser indicada para prémio nobel da paz, como hoje Trump e, quase quase, Netaniahu, numa espantosa demonstração da coerência das democracias sob a égide do imperialismo, dizia com uma lágrima ao canto do olho: não posso perdoar aos árabes obrigarem-nos a matar os seus filhos.
Os sionistas não estão e nunca estiveram sozinhos, assim como os próprios nazis: O desastre iminente dos nazis em Stalinegrado levou o Papa Pio XII a perder a vergonha e a acudir com as suas armas mais refinadas na mensagem de Natal de 1942: «A hora não é de lamentações mas de actos… Possuídos pelo entusiasmo das cruzadas unam-se os melhores da cristandade…ao grito: ‘É Deus que o quer’! Prontos a servir e a sacrificarem-se como os cruzados de antanho. Exortamos-vos e conjuramos-vos… a compreender intimamente a gravidade terrível das presentes circunstâncias. Quanto a vós, voluntários que participais nesta santa cruzada dos novos tempos, levantai o estandarte… declarai guerra às trevas de um mundo sem Deus».
Quando tudo julgavam possível, afinal com razão, os Bush também sob a égide de Deus, so god help me, atiraram-se ao Afeganistão o qual, como é tradição, deu cabo deles, e depois ao Iraque com base numa monstruosa mentira de todos conhecida e que fez das democracias ocidentais babadas serviçais da NATO por onde o imperialismo americano faz delas gato sapato. Enfim um nojo!
E assim chegamos ao ponto em que as democracias ocidentais sob a ameaça do bastão da NATO se conluiam para manter uma guerra brutal que destrói a Ucrânia e, ironicamente, fortalece a Rússia que seria suposto enfraquecer e derrotar às ordens dos EUA que, desde as bombas de Hiroshima e Nagazaki, só fazem crimes e provocam desastres humanitários, na sua estratégia terrorista de mudança de regime e de longa experiência de derrotas e desastres, do Afeganistão ao Iraque, depois da fantástica derrota, aliás anunciada desde a invasão na Baía dos Porcos, ordenada pelo querido John Fitzgerald Kennedy que também lançou a guerra do Vietnam de onde o colonialismo francês tinha saído de alpergatas e feridas purulentas indo tentar melhor sorte na Argélia que também lhe não perdoou.
No Vietnam apesar do napalm e do agente laranja, frente a um exército popular alimentado com uma malga diária de arroz e a força anímica irresistível de um povo em luta pela liberdade e pelo socialismo os ianques saíram ainda mais ridicularizados franceses da Indochina.
O “Sistema da Guerra” é um livro que, ao modo de Eça de Queiroz, nos mostra a nudez crua da verdade sob o manto, não diáfano da fantasia, mas conspurcado das mentiras criminosas impostas pela ideologia imperialista.
Com “Sistema da Guerra”, pela sua clareza e real simplicidade, somos colocados no centro das grandes contradições geopolíticas e geoestratégicas, libertos da ganga deletéria e irracional da propaganda imperialista que nos é imposta pelos tristes filhos de Elon Musk e Donald Trump.
Pela clareza com que isola e destaca o papel principal e decisivo do imperialismo norte-americano no desencadear das maiores tragédias geopolíticas e humanitárias da nossa época, a que como o grande jornalista escritor austríaco Karl Krauss expôs, numa sátira sem rival sobre a IGM, podemos chamar de « Os últimos Dias da Humanidade, »…
… “O Sistema da Guerra” arma-nos para a luta actual contra o armamentismo, pelo fim da NATO, contra os assassinos de voz meiga que querem fazer dos filhos do povo carne para canhão ao som do hino contra os canhões marchar marchar quando o povo adoptou a grândola vira morena terra da fraternidade estendida a todos os povos do mundo.
E a pátria é o fétiche com que querem substituir a luta de classes pela amálgama da carne para canhão sob o olhar sardónico dos oligarcas de todas as cores
“O Sistema da Guerra” é um livro simples e precioso para levar aos trabalhadores e também aos intelectuais tolhidos por décadas de amaciamento da vontade e de virar de costas à realidade e à utopia.
Obrigado Liberato por este trabalho exemplar.

