O governo tem de ser confrontado com forte mobilização

O governo israelita mantém o ataque genocida e a aniquilação pela fome e pelo bloqueio do território à ajuda humanitária, como ficou mais uma vez evidente com a interseção ilegal da Global Sumud Flotilla. O governo português anunciou o reconhecimento do Estado da Palestina, mas não é consequente com essa declaração. Se um Estado reconhecido pela maior parte dos países está a ser atacado, invadido e o seu povo dizimado, têm de ser assumidas medidas de isolamento do agressor.

Portugal deve chamar o embaixador israelita, exigir a libertação dos detidos da Flotilla, suspender as relações diplomáticas, juntar-se na UE aos países que defendem a suspensão do Acordo de Associação UE-Israel e impedir o trânsito de mercadorias e de equipamentos militares para Israel, nomeadamente com a proibição da utilização da Base das Lajes e de qualquer porto nacional.

REDE ECOSSOCIALISTA – COMUNICADO

1. O país atravessa um ciclo de ataques aos direitos laborais e dos imigrantes, com iniciativas legislativas para novas limitações ao exercício do direito à greve, incentivos à precariedade e facilitação da uberização e dos despedimentos. As medidas fiscais são favoráveis ao capital e a caducidade da contratação coletiva é agravada. A redução da força negocial dos trabalhadores facilita a imposição de salários baixos, num modelo de crescimento económico trabalho-intensivo de baixo valor, extrativista e ambientalmente predatório.

O governo tem de ser confrontado com forte mobilização da sociedade em defesa de direitos e salários, contra este pacote laboral. Os esforços para que as centrais sindicais, sindicatos independentes e outros movimentos sociais se juntem em jornadas de luta, desde já a Marcha sobre Lisboa a 8 novembro da CGTP, são relevantes no caminho para a convocação de uma greve geral conjunta.

2. A abertura do ano escolar com milhares de alunos sem professores, grande carência de lugares em creches, sem respostas para quase metade das necessidades, e mais de 12 mil crianças à espera de vaga no pré-escolar, espelham o estado de degradação a que a direita conduz o ensino público. A extinção da FCT (Fundação para a Ciência e Tecnologia) e a criação de uma Agência para a Investigação e Inovação, sem aumento do investimento em I&D, coloca a investigação ao serviço dos interesses do mercado. O descongelamento das propinas no ensino superior já foi anunciado e agravará a elitização e as dificuldades na entrada para o ensino superior, já evidentes com a diminuição de candidaturas para o ano letivo em curso. Uma juventude livre implica ter condições para prosseguir a sua formação e poder cumprir as suas expetativas.

3. A crise habitacional agrava-se e o preço dos imóveis para compra ou arrendamento bate recordes, com milhares de inscritos para acesso a habitação pública com rendas compatíveis com os salários. O Governo já anunciou o fim da limitação aos aumentos anuais das rendas nos novos contratos. Acrescentou recentemente um pacote de medidas que, no essencial, consiste em borlas fiscais para quem já lucra com a especulação imobiliária. Mas recusa qualquer controlo do mercado. Não há uma única medida que leve à mobilização dos fogos devolutos nas mãos de grandes proprietários e de fundos imobiliários, a forma mais célere e ambientalmente sensata para aumentar a oferta de casas com renda acessível.

4. No SNS, o chamado Plano de Emergência e Transformação na Saúde revela-se mera propaganda, com a situação a agravar-se de forma visível e dramática. É alarmante o encerramento de urgências obstétricas na região de Lisboa e Vale do Tejo, Aveiro, e Braga em regime de contingência. Os partos fora das maternidades e os tempos de espera nas urgências crescem, o número de utentes sem médico de família continua a aumentar, atingindo cerca de 1,6 milhões de pessoas. O desinvestimento no SNS e a falta de soluções para a carência de profissionais, visa incentivar a oferta do setor privado e os planos das seguradoras para a saúde.

5. O país voltou a confrontar-se com uma vaga de incêndios rurais no centro e norte do país; recentemente chegaram também ao sul. O panorama nos territórios rurais e do interior é o do abandono das populações à sua sorte. A inexistência de políticas públicas de incremento da gestão coletiva e de ordenamento florestal, sobretudo do minifúndio, aliada aos efeitos das alterações climáticas, favorecem os interesses ligados ao extrativismo florestal.  Áreas com estatuto de proteção da natureza são varridas por incêndios cada vez mais extensos e prolongados no tempo, perante populações indefesas. A falta de investimento numa força de proteção civil robusta e estruturada, contrasta com a imposição de uma deriva armamentista e despesista. Os planos para aumento da área de regadio são um erro que se confronta com a escassez de água, acentuada com as alterações climáticas.

6. O brutal desastre no elevador da Glória, em Lisboa, revelou problemas de insegurança na principal empresa municipal de transportes, demonstrou a irresponsabilidade de uma gestão da cidade virada para a utilização do espaço urbano como mero suporte dos negócios. As políticas neoliberais de externalização de serviços, nomeadamente das manutenções, a ocultação de erros e falhas para que os orçamentos sejam diminuídos aos mínimos, o desligamento do executivo municipal dos trabalhadores que operam na cidade, começam a ser tornadas do conhecimento público. Confrontados com o desastre, presidentes de câmara e do conselho de administração procuram fugir às suas evidentes responsabilidades políticas e de gestão. Carlos Moedas tentou ao longo do mandato desviar a atenção dos problemas reais de insegurança na cidade para as comunidades imigrantes e para a rua do Benformoso. Afinal, a insegurança, que levou à morte de 16 pessoas e dezenas de feridos, parte do próprio município.

7. Entretanto, o primeiro-ministro opôs-se à divulgação do número da matriz dos seus 55 imóveis. Casas e terrenos passaram a estar fora do escrutínio público, nomeadamente como foram adquiridos e quem esteve envolvido nas transações. O espectro da falta de transparência dos negócios privados de Montenegro e da Spinunviva nas ligações à política e aos cargos públicos que desempenha ressurgem e adensam-se. As portas giratórias são já um lugar-comum.

O QUADRO DE UMA MAIORIA QUE, SEM O SER, SE TORNOU ABSOLUTA

8. Apesar de a coligação AD (PSD/CDS) não ter conseguido maioria absoluta nas recentes eleições Legislativas, o facto é que no quadro atual o Governo da direita sente-se de mãos livres para agir como bem entende na prossecução do seu programa neoliberal, um caminho de austeridade a visar os setores da população dependentes do trabalho, com salários baixos e intermédios, os mais jovens dessas famílias e a população idosa com pensões baixas. Nesta política o Governo conta com a anuência, ou mesmo com o apoio, da IL e do Chega, com quem Montenegro negoceia as medidas, como agora aconteceu com a Lei dos Estrangeiros, e com quem se vai concertar no OE 2026. O PS “dialogante”, que esperava com a mudança de liderança alcançar uma via de bloco central, está colocado à margem enquanto o Governa se encosta à extrema-direita. “Quando um diz mata ou outro diz esfola”.

9. Acresce que o Governo no OE 2026 está protegido pela realização de eleições para PR em janeiro, sendo constitucionalmente impossível qualquer ameaça sequer de queda do Governo e dissolução da AR mesmo que a proposta de OE reprovasse, o que não parece ser verosímil. Neste quadro de uma maioria que se tornou absoluta, a luta institucional não deixa de ser importante, enquanto tribuna de denúncia, confronto e proposta. Porém, decisivo é o combate que terá de envolver milhões nos vários setores da sociedade, do trabalho ao ambiente, da luta pela paz à solidariedade com o povo palestiniano, da defesa da saúde e da escola públicas à exigência de condições de vida dignas, das lutas contra as discriminações às batalhas pelos direitos das mulheres, contra a homofobia e o racismo, das lutas pela paz e o armamentismo contra as guerras, as militares e as sociais.

ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS

10. A cerca de 4 meses das eleições presidenciais, as esquerdas apresentam-se divididas e sem qualquer dinâmica que lhes possibilite a disputa de uma previsível segunda volta. É lamentável a incapacidade de encontrar uma candidatura presidencial que defendesse um programa capaz de mobilizar as esquerdas. O surgimento dessa candidatura ocuparia um lugar relevante no debate e na disputa eleitoral, marcaria um campo forte e distintivo nesse combate, com a vantagem de a direita e a extrema-direita se terem pulverizado e já contarem, por agora, com 4 ou 5 candidatos. Se há eleições em que a conjugação de forças à esquerda é decisiva, as presidenciais são o caso absolutamente evidente

11. Não é credível que não tivesse sido possível encontrar uma candidatura com a capacidade de unir neste desafio eleitoral vastos setores à esquerda. O problema é que as forças políticas do centro-esquerda e da esquerda estão à defesa, perceberam que tiveram uma derrota nas Legislativas, mas não querem assumir erros e mudar as políticas que levaram a esta situação. Preferem refugiar-se nos seus redutos, defensivamente apresentar candidatos próprios que dificilmente terão voz forte no período eleitoral, e, por isso, incapazes de impulsionar alguma mudança ou disputa significativa. É este o estado atual das esquerdas. Se não houver qualquer esforço para mudar este quadro, vai ser o favorecimento da direita e uma pressão brutal para o voto útil e a desistência das candidaturas à esquerda do PS.

12. A Rede Ecossocialista não apoia candidaturas em específico, mas antes as políticas que os candidatos sejam capazes de afirmar numa perspetiva ecossocialista, que coloquem em causa as políticas da UE, defendam a transição energética e a descarbonização como prioridades, ao lado das condições de vida e dos direitos de quem trabalha ou trabalhou, garantam direitos humanos a migrantes, repudiem a vertigem belicista, questionem o aumento orçamental militar e a participação na NATO.

UCRÂNIA E PALESTINA SÃO O NÓ GORDIO DA PAZ

13. O espectro da guerra está a ser estimulado por toda a Europa para justificar o crescimento da despesa militar nos orçamentos nacionais, sob as ordens do presidente dos EUA. Em consequência e a par disso é desvalorizada a urgência de medidas de mitigação dos efeitos das alterações climáticas que ameaçam a humanidade, da descarbonização da economia e da sociedade. O prolongamento da guerra na Ucrânia dá suporte a esta política seguida pela Comissão Europeia, pela generalidade dos governos da UE, e pela NATO. O anúncio da possibilidade de fornecimento pelos EUA à Ucrânia de mísseis de cruzeiro de longo alcance Tomahawk, capazes de atingir em profundidade a Federação Russa, faz escalar o conflito em vez de uma firme e coerente estratégia para um processo de paz. O prolongamento da guerra entre a Rússia e os EUA em território ucraniano, à custa de milhares de vidas de um e outro lado, tem de ter um ponto final.

14. A apresentação de um “plano de paz” para Gaza acordado por Trump e Netanyahu, sem qualquer intervenção dos palestinianos, configura um verdadeiro plano neocolonial com ocupação militar israelita. Visa impedir a formação de um Estado palestiniano e impor a subjugação da Cisjordânia e de Gaza. É evidente a falência do argumento de que Israel apenas se defenderia dos “terroristas do Hamas”, discurso a que alguma esquerda chegou a ser permeável. O governo israelita mantém o ataque genocida e a aniquilação pela fome e pelo bloqueio do território à ajuda humanitária, como ficou mais uma vez evidente com a interseção ilegal da Global Sumud Flotilla. O governo português anunciou o reconhecimento do Estado da Palestina, mas não é consequente com essa declaração. Se um Estado reconhecido pela maior parte dos países está a ser atacado, invadido e o seu povo dizimado, têm de ser assumidas medidas de isolamento do agressor.

15. A pressão popular tem de aumentar sobre os governos europeus, pela paz na Ucrânia, pelo cessar-fogo imediato em Gaza com a abertura de corredores humanitários urgentes, e pela condenação com sanções do governo israelita. Portugal deve chamar o embaixador israelita, exigir a libertação dos detidos da Flotilla, suspender as relações diplomáticas, juntar-se na UE aos países que defendem a suspensão do Acordo de Associação UE-Israel e impedir o trânsito de mercadorias e de equipamentos militares para Israel, nomeadamente com a proibição da utilização da Base das Lajes e de qualquer porto nacional.

A Direção da Rede Ecossocialista

Out.2025

Um pensamento sobre “O governo tem de ser confrontado com forte mobilização

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